Família imediata:
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Filha de Manoel José Correia e Gertrudes Pereira Correia Mulher de Ildefonso Pereira Correia, Barão do Serro Azul Mãe de Iphigenia Correia; Maria Clara Correia e Ildefonso Correia do Serro Azul Irmã de Leocádio José Correia e Manoel do Rosário Correia |
Maria José Correia, nossa Baronesa, foi casada com Ildefonso Pereira Correia, Barão do Serro Azul. Ambos nascidos em Paranaguá eram primos. Ela irmã do famoso Dr. Leocádio José Correia. Mulher de fibra, culta e, inteligente, viu-se abatida com o covarde assassinato de seu marido, o Barão. Vamos mostrar a carta que escreveu ao Barão do Ladário, e lida perante o Senado Federal. Escrita de próprio punho, revê-la toda a dor de mãe e esposa, diante dos fatos acontecidos. Vale a pena ler este testemunho para que se conheça a verdade de nossa historia, e identifiquemos o verdadeiro covarde, que hoje tem avenida em Curitiba, que leva o seu nome |
Exmo. Sr. Barão do Ladário: Cumprimentando a
V. Exa., espero que me será perdoada esta liberdade com que vou prestar a V.
Exa. informações sobre o monstruoso atentado que trouxe em luto eterno o meu
lar, para sempre deserto das alegrias que eram para o meu coração de esposa e
para a inocência dos meus filhos, hoje órfãos de pai, o único e grato conforto
na vida. Aqui, desta sombra de claustro em que sinto minha alma sepultada, e
onde a coragem que me resta nasce da própria imensidade do meu sofrimento, eu
começo certa, senhor, que a justiça indefectível de Deus está escolhendo entre
os puros e os bons deste mundo os instrumentos poderosos de que há de em breve
valer-se para a solene separação que se lhe deve na terra. E V. Exa. foi dos
primeiros entre esses que em todos os tempos e no meio de todas as nações como
que a Providência designa para serem o seu verbo de fogo a falar às almas, a
pungir os corações, emocionando os povos, apontando-lhes no céu a cor azul e
imaculada da Lei, para que as magistraturas abalem-se e as consciências volvam
a ouvir a voz clamorosa dos túmulos, onde o martírio não dormirá eternamente,
porque eterna na terra só há de ser a divina soberania do Direito e da Verdade.
E desde que V. Exa., justamente assombrado ante o que se passa neste País, está
sendo um dos poucos (mas poucos que têm a força das legiões) que se empenham
pela desafronta desta geração perante a História, julgo que é do meu dever, e
dever piedoso e sano que me e imposto pela memória saudosíssima de meu infeliz
esposo, contribuir para que V. Exa. exerça neste momento a heróica e sagrada
missão de clamar por desagravo completo à honra e à inocência das vítimas que
aqui foram sacrificadas ao furor incontinente e aos desvarios dos homens que já
têm a consciência galvanizada pelo mal.
Não repetirei o que por certo V. Exa. já sabe, em relação aos sucessos
que desde princípios de 1894 se deram neste Estado; mas em poucas palavras
recordarei quanto possa servir para dar uma idéia bem nítida do papel que coube
a meu inditoso marido, o Barão do Serro Azul, no meio dos acontecimentos que se
desdobraram. V. Exa. de certo já tem notícia das condições em que o então
governador deste infeliz Paraná, Dr. Vicente Machado da Silva Lima, abandonara
esta capital em janeiro de 94, deixando forças do governo lutando em diversos
pontos e sem comunicar essa inesperada resolução sequer aos mais íntimos amigos
seus que se achavam na cidade. Curitiba (a mísera Curitiba! – como
justificadamente disseram folhas de S. Paulo) ficou inteiramente entregue aos
azares do desconhecido; pois o governador, ao retirar-se, nem ao menos
incumbira a Municipalidade da polícia urbana! Tribunais, repartições públicas,
comércio, oficinas, e as famílias – absolutamente à mercê do primeiro salteio,
enquanto a autoridade legal contradizia os seus protestos de véspera fugindo em
desespero para o Estado vizinho. É fácil fazer uma idéia da situação em que se
viram estas populações, sufocadas de pavor ante os estranhos sucessos que se
passavam, e ainda sob as, impressões e suspeitas, que lhes haviam posto no
coração transtornado, de que andávamos em vésperas do saque, do extermínio, do
arrasamento que passariam por sobre esta terra com as hostes da revolução. Em
semelhante conjuntura, as classes em que é mais natural e profundo o espírito
de conservação recorreram ao único meio que parecia eficaz no sentido de
garantir ao menos os direitos primordiais das gentes: isto é, fizeram a escolha
de uma comissão que tomasse a si o trabalho de neutralizar, como fosse
possível, as violências a que se achava exposta a cidade. Foi assim que meu
marido, com outros membros do comércio e das diversas classes, tomou a si o
grande e penoso encargo de colocar-se entre os revolucionários triunfantes e a
família paranaense, cuja paz e cujos direitos o governo legal estava
impossibilitado de assegurar no momento. A população inteira de Curitiba, os
próprios adversários ou desafetos do Barão do Serro Azul ainda podem dizer hoje
como e com que sacrifício de sua saúde e de seus interesses ele tornou-se o
centro e a alma da comissão, agregando tudo, contendo ímpetos, fazendo em suma
quanto pudesse atenuar, para o comércio, para a indústria, para a propriedade e
para a família curitibana, os efeitos da emergência excepcional em que se via a
cidade. Um só documento será capaz alguém de apresentar de que meu marido
sequer tivesse simpatias pela revolução. Em vez disso, seria facílimo fornecer
provas positivas de que o Barão do Serro Azul, aos próprios chefes
revolucionários, nunca dissimulou o seu modo de pensar a respeito do imenso
descalabro que a invasão vinha causar ao Paraná e especialmente quanto à
eficácia do extremo recurso da revolta como meio de corrigir os erros da
tirania e operar o restabelecimento da Constituição e das leis – de modo
horroroso subvertidas pelas paixões dos próprios homens que tinham o dever de
conservar-lhes imaculada a pureza e majestade intangível. Foi tal, senhor – e o
Paraná inteiro aí tereis para confirmá-la -, foi tal a ação exercida por meu inditoso
marido nos dias dolorosos em que Curitiba esteve pelo Governo entregue à
revolução triunfante, que o comércio, a indústria, a imprensa, todas as classes
sociais apontavam-no sempre como o elemento principal da grande força que
constituiu-se a égide do direito, da ‘Ordem, da tranqüilidade de todos, tanto
quanto era humanamente possível naqueles momentos anormais. “E tão certo e
convencido estava o Barão do Serro Azul de que os serviços que prestara pela
última vez a esta terra, que tanto lhe mereceu e que por ninguém..mais do que
por ele, foi servida com desinteresse e solicitude indiscutíveis, tão certo,
digo, senhor, de que tais esforços seriam reconhecidos e louvados pelo Governo
que retomava o seu posto – que absolutamente recusou fazer o que os culpados
fizeram. Com calma e até com satisfação e alacridade, esperava, pode-se dizer
sorrindo, o Governo legal, a quem desejava até dar contas do modo nobre como
soubera zelar do direito, da fortuna e da honra de seus patrícios – honra,
direito e fortuna que a autoridade legítima não tinha tido a coragem de amparar
e defender. Mas, logo nos primeiros dias
após a chegada das tropas legais, entre cujas fileiras o governador que fugira
entrava como um triunfador, meu marido percebeu que os sentimentos dos que
voltavam desmentiam toda a convicção com que via restabelecer-se a Lei na terra
paranaense, e isto não sem pasmo da população inteira, que supunha-se mais com
direito à condolência pelo seu sofrimento, do que no risco de vir a padecer
castigos por uma culpa que só o Governo cometera desertando o seu posto de
guarda da Lei e garantidor da paz e da ordem. E que julga V. Exa. que fosse o
pensamento de que vinha cheia a alma ,dos que haviam fugido? Não quero alongar-me demais dando conta do
que ocorreu, dos excessos de toda ordem que caracterizaram os angustiosos
longos primeiros dias da reocupação legal. Um dia, há de haver quem se incumba
de dar à América, para escarmento desta geração, uma pintura fiel e minuciosa
desses incríveis sucessos, que encheram de mágoa e de santa revolta até a alma
dos mais indiferentes, que fizeram esquecer de todos os males, os
insignificantes males da revolução. Para
o que me preocupa, é bastante dizer a V. Exa. que entre o assombro que lhe
produzia a descaroável e monstruosa conduta que se anunciava contra todos os
que não tinham oposto à invasão a resistência da fuga, e a mágoa que lhe calou
fundo no coração sentindo ainda uma vez a sua virtude impotente para fazer
emudecer a perversidade, a inveja e a calúnia – meu marido cedeu a instâncias
da família reservando-se às violências que tinham já começado a ser praticadas
contra a população, deve-se dizer, pois os quartéis, os teatros e até casas
escolares desta Capital regurgitavam de presos, com toda expansão da ferocidade
republicana, semelhante aos instintos daquele deus cujas iras aplacavam-se pela
vingança e pelo sangue dos holocaustos. Dessa cautelosa reserva, no dia 10, meu
marido saiu, como saíra Jesus das Oliveiras – entregue por um amigo dos muitos
em que teve a infelicidade de crer. Já estava em nossa casa muito tranqüilo e
confiante na mísera justiça dos homens, e até sem reprimir palavras de elogio
ao general Everton Quadros (que o havia apenas pro formula detido sob palavra),
quando o coronel Pires Ferreira, acompanhado de outros militares, procura meu
marido para uma conferência, conferência esta na véspera anunciada, com todas
as seguranças de cordialidade e boa-fé, por parte do comandante do Distrito.
Como (talvez pressentindo que aqueles homens traziam para o meu lar a desgraça
que aqui está bradando eternamente para o céu) não quisesse eu acompanhar meu
marido à sala, após uma prosa cordial e expansiva, tive de ver no recinto
interno de minha família aquelas frontes cuja impressão ainda hoje me tortura.
E então, meu esposo contou-me que o governador fazia uma carga, imensa de
responsabiliades contra ele e que por isso devia recolher-se ao quartel no dia
seguinte. Sem conter o incômodo que todos deviam ter notado no meu semblante,
perguntei logo se era com a prisão que se compensavam os serviços feitos por
meu marido a Curitiba, ao que me respondeu o coronel Pires Ferreira: ‘Oh, minha
senhora, pois V. Exa. esquece que sou o coronel Pires Ferreira, velho amigo do
conselheiro Correia e portanto amigo de seu esposo! Senhora Baronesa,
tranqüilize-se: o Barão não é preso, o Barão é meu hóspede! No dia seguinte, meu marido recolheu-se a uma
sala do quartel do corpo comandado pelo coronel Pires Ferreira. Ali deu-se a
mais plena liberdade ao hóspede, com quem o comandante conviveu na mais
perfeita e aparentemente mais cordial intimidade durante 6 dias. A sala em que
meu marido foi aposentado tinha janela para a rua e a entrada era inteiramente
franca a todos. À noite, o Barão, o coronel e outros oficiais jogavam quase
sempre o solo. Mas ouça V. Exa., ouça,
senhor, e diga que não crê para honra da piedade humana: vive ainda o oficial
do exército que, compungido, disse uma vez a pessoa de minha família que sentia
horror ao ver aquele homem, que tinha conhecimento de tudo que estava para
passar-se, e ali a encarar o Barão sem tremer e a tratá-lo de amigo! Talvez V. Exa. não compreenda ou pelo menos
não encontre explicação para as deferências especiais que se tinham com meu
marido. Pois bem, agora V. Exa. fica sabendo que o plano era este: instigar no
hóspede o desejo de fugir para ter trucidado sem responsabilidade
criminal! Decorridos 4 ou 5 dias,
achando-me de visita a meu marido, ouvi do coronel: ‘Já sabe, Sra. Baronesa,
que conversei hoje longamente com o Barão. Estou ciente do quanto houve por
aqui. Deixe tudo por minha conta’. E passado um instante acrescentou: ‘E não há
de ver, Sra. Baronesa, que o Barão é também religioso! Ironia pungente à fé
puríssima e à conhecida religiosidade de meu esposo. E quando confirmei os sentimentos
que se estranhava naquele dito, ouvi o coronel Pires Ferreira, ouvi sair dos
lábios meio cerrados daquele homem sinistro e quase a meia-voz: ‘pois que se
console… porque Cristo também sofreu…’ Tais palavras (e no tom em que foram
ditas) arrepiaram-me; entretanto sempre eu entendia que a resignação
aconselhada era para aquele sofrimento da prisão. Nesse dia, e sem que a nova
me magoasse mais do que era na¬tural (pois o coronel soubera habilmente
preparar o meu espírito para ela) tive ciência de que o Barão se passaria para
o quartel do 17.°, onde ficaria com outros presos. Efetivamente, no dia
seguinte meu marido ia, de carro e com todas as atenções, para a sua nova
prisão. Quando ele tomou o carro, o coronel, da janela, correspondeu
amavelmente ao seu último aceno de mão, e logo que o veículo partiu – da alma
do coronel Pires Ferreira saiu esta frase ouvida por alguns de seus oficiais:
‘Este será liquidado dentro de dois dias… O prognóstico realizou-se com a
diferença apenas de um dia. O resto V. Exa. sabe, e eu procuro desviar da minha
imaginação aquele trem-esquife que, às 10 horas da noite de 20 de maio de 94,
partiu de Curitiba conduzindo o Barão do Serro Azul e seus companheiros de
sacrifício. No momento em que o
comboio-tumba partia da estação, o coronel Pires Ferreira achava-se num dos
clubes desta Capital e da sacada do prédio houve quem lhe surpreendesse esta
frase escapada daquela alma tremenda: ‘Oh que inconveniência! Deixarem apitar
um trem destes!…' V. Exa. decerto há de
ter tido notícia do modo como se consumou aquela monstruosidade que maculou
para sempre a civilização deste país e que não encontra símile na história da
humanidade. E não fora a minha fé, senhor, a minha fortaleza moral e a
resignação que sinto lembrando-me de Jesus, como se compreenderia que me
ficasse ainda, depois de todas estas angústias, este resto de vida e de coragem
para resistir à loucura no meio da minha desgraça! Só alguns dias passados, o boato começou a
correr pela cidade; e às esposas aflitas que procuravam o comandante militar
para ouvir o desmentido da nova inverossímil, afirmava o general Everton
Quadros, com sorrisos nos lábios e com mostras de sinceridade através das quais
era impossível perceber um resquício de remorso, afirmava sob sua palavra de honra
que os presos haviam seguido para o Rio. . E quando a alma da população inteira
foi se enchendo de opressão horrível ante as versões que corriam como um clamor
de dies irae, deixando por sobre a Capital do Paraná a sombra pavorosa da
agonia e do luto – o general, cuja espada viera restaurar a Lei, mandava que as
bandas militares, com o som da música festiva, dispersassem os agouros que
suspendiam a vida de um povo, como quem a gritos estridentes espanta uma
corvada que fareja matanças! Ao mesmo tempo, senhor, fazia-se declarar às
famílias das vítimas que não podiam cerrar as portas nem dar outras
demonstrações de luto… sim – visto como era falso o que se falava. . . Quando, mais tarde, meu procurador pediu na
repartição do comando do Distrito a certidão de óbito, esta foi forneci da
nestes termos: ’0 Barão do Serro Azul foi fuzilado na serra por ter-se
revoltado contra a escolta que o conduzia para o Rio'. O governador deste Estado naquele tempo, V.
Exa. sabe também, é hoje senador da república, e com o coronel Pires Ferreira,
aí está clamando por que, antes de tudo, se aprovem os atos do marechal
Floriano e necessariamente todas as monstruosidades cometidas em nome do
vice-presidente da República. Até agora, portanto, os dois homens (homens,
senhor!) que fizeram no Itararé o conhecido pacto negro, mantêm-se fiéis ao seu
juramento de covardia e de sangue: estão ambos no Senado da Pátria,
naturalmente bendizendo a mísera que, como Prometeu aos seus abutres, os
alimenta de posição e talvez de fortuna, com o próprio sangue e com a desgraça
de seus filhos. É possível, senhor, que
se quisesse contestar esta narração; e V. Exa. compreende que almas assim
avassaladas do crime e entregues às convulsões da sua fereza devem ter ainda a
serenidade da hiena para o desplante de limpar das fauces o sangue das vítimas.
É também verdade que poderiam aludir à minha suspeição de mulher e de viúva,
obumbrada pela fatalidade que me feriu. Mas, senhor, o que aí fica – peço a V.
Exa. que não esqueça agora – nasce d’alma de uma criatura que tem os olhos
voltados para a misericórdia de Deus e que não clama senão pela Justiça, para
que o martírio das vítimas não fique pesando sobre os destinos deste pais, em
que tenho de deixar os meus tristes filhos. Curitiba, 8 de julho de 1895. –
Maria José Correia – Baronesa do Serro Azul. Fonte: http://www.blogizazilli.com/index.php/medicina/baronesa-do-serro-azul
Vicente Machado foi um grande salafrário,
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